11 abril 2019

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL DESPERTA FASCÍNIO E TEMOR NO BRASIL, DIZ PESQUISA


A IA está entre nós e o mundo será, em parte, governado pelos algoritmos

Por Reinaldo Canto*
Talvez não seja como num passado recente quando o temor quanto ao avanço da chamada inteligência artificial estava na possibilidade de o ser humano ser dominado por máquinas e nos tornaria a todos dispensáveis. Esse cenário já foi bem explorado, entre outros, pelo cinema e pela literatura.
O certo é que o avanço da IA ao mesmo tempo que abre enormes possibilidades também apresentam temores diferentes da ficção, mas não menos desafiadores e preocupantes.
Isso foi o que constatou a pesquisa realizada pela Market Analysis e cujos resultados estão sendo publicados com exclusividade por CartaCapital.
No início de dezembro do ano passado foram realizadas entrevistas com 513 adultos usuários da internet no país para entender e identificar as percepções da influência da inteligência artificial em diversas áreas e seu impacto no futuro das profissões.
Questões como a robotização em atividades industriais; a eficácia dos algoritmos nos atendimentos do dia a dia e até mesmo nas vendas; seu uso nos diagnósticos médicos e até mesmo nas investigações policiais e na Justiça.
São inúmeras as suas possibilidades, assim como as dúvidas que nascem da utilização maciça da inteligência artificial impactando a todos seja de maneira mais direta ou indireta. E, claro, o futuro de muitas profissões colocadas em xeque!
A questão do trabalho parece ser o que mais preocupa os brasileiros de maneira geral. A pesquisa revelou que, conforme têm sido abordado com frequência pela mídia, algumas profissões tenderão a simplesmente desaparecer. Sete em cada dez brasileiros entrevistados acreditam que trabalhadores da indústria deverão ser cada vez mais substituídos por máquinas. Uma tendência que já vem sendo observada há algum tempo em linhas de produção ocupadas por robôs. Mas não só. Perguntados sobre outras profissões, a enquete constatou que mais de metade dos pesquisados acredita que contabilistas, faxineiras, motoristas e pesquisadores de mercado, entre outros, estão com suas profissões em sério risco. Já 1 a cada 3 ou 4 entrevistados crêem que até mesmo jornalistas, professores, enfermeiras e mesmo policiais podem desaparecer. Para os entrevistados, profissões como médicos, advogados e terapeutas aparentam estar menos ameaçadas.
Interessante notar que os riscos apontados pela pesquisa colocam a inteligência artificial atuando tanto nas atividades de produção tipo “mão na massa” como na coleta e análise de dados. Um leque amplo e profundo nas quais as novas tecnologias podem atuar.
Menos assustador e mais positivo quanto às suas consequências, a pesquisa revela as boas expectativas que as pessoas nutrem quanto à influência dessa inteligência artificial em áreas como a saúde, segurança e Justiça. 59% dos ouvidos pela pesquisa acreditam que a IA pode auxiliar os médicos, mas não substituí-los. Situação semelhante no que se refere ao sistema judicial. Apesar de sua contestada eficiência, de cada 10 consultados seis demonstram receio na fria decisão apresentada por dados e números enquanto apenas 27% dos entrevistados conferem apoio a uma realidade em que a inteligência artificial ditaria as sentenças judiciais. Já para a substituição de policiais, 31% ou 1/3 das pessoas que participaram da enquete consideram o uso da IA como uma boa alternativa às falhas humanas cometidas pelos representantes da lei.
Uma das menores resistências encontradas na pesquisa se refere à mobilidade urbana, tendo como pano de fundo a irresponsabilidade de motoristas que causam anualmente mais de 50 mil mortes no país. Mais de metade dos entrevistados se mostrou favorável à substituição de policiais rodoviários e motoristas por carros autônomos.
Para Fabián Echegaray, diretor-geral da Market Analysis e responsável pela pesquisa, “na medida em que cresça a frustração com o desempenho de alguns profissionais (médicos, motoristas, cuidadores) e algumas instituições (clínicas, polícia militar, justiça), e o discurso da efetividade e ganhos econômicos da robotização se popularizar, é provável imaginar um apoio maior para iniciativas que defendam um mundo governado por algoritmos”.
Difícil será imaginar que esse cenário realmente não se aprofunde. A inteligência artificial parece que veio mesmo para ficar e o que precisamos é que ela traga reais benefícios e não seja responsável por amplificar ainda mais problemas como a indiferença às questões sociais e a exacerbação a alguns dos principais desafios da humanidade, entre eles, as mudanças climáticas e a crescente radicalização ideológica.

*Exclusiva para Carta Capital



25 março 2019

CARTA DE REPÚDIO AO DESMONTE DO MEIO AMBIENTE E AGRICULTURA NO GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO PELA GESTÃO JOÃO DORIA

Desde o início do ano, acompanhamos o desmonte de políticas públicas importantes nas três esferas do governo: Federal, Estadual e no Município de São Paulo. Na atual gestão do governador João Doria, o processo de reestruturação tem sido conduzido sem qualquer participação das equipes técnicas e administrativas das áreas afetadas e tampouco do restante da sociedade. A fusão de três Secretarias (Meio Ambiente, Saneamento e Recursos Hídricos e Energia e Mineração), que deu origem à Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente (SIMA), no comando do Secretário Marcos Penido, representa um enfraquecimento da pauta ambiental. Na já rebaixada Subsecretaria de Meio Ambiente, sob a gestão de Eduardo Trani, os Decretos n° 64.131 e n° 64.132, de 11/03/2019, extinguiram a Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais (CBRN), pulverizando e submetendo suas atribuições uma parte à agora chamada Coordenadoria de Fiscalização e Biodiversidade (CFB/SIMA) e a outra parte à Secretaria da Agricultura e Abastecimento (SAA), especificamente à Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável (CDRS), forma como passou a ser denominada a tradicional Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI/SAA). Desta forma, em um mesmo ato, desvalorizou e rebaixou a Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) e os trabalhos de estímulo à Biodiversidade Paulista e tirou o foco das ações de Fiscalização Ambiental, não sendo possível assegurar, nesse novo contexto, a efetiva proteção e recuperação da biodiversidade e o cumprimento da Política Estadual do Meio Ambiente. Acreditamos que a produção rural e a conservação ambiental são interdependentes, e o desenvolvimento sustentável na zona rural será resultado do trabalho conjunto entre a SIMA e a SAA, cada uma com suas atribuições, vocação e missão. Na reconfiguração do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), por meio do Decreto n° 64.122/2019, a presidência passou a ser ocupada pelo Secretário da SIMA, que representa as três antigas Secretarias, deflagrando um claro conflito de interesses, por serem o licenciado, o licenciador e o fiscalizador a mesma pessoa jurídica. Ainda, não houve garantia de participação da área responsável pela Política de Biodiversidade (Decreto Federal n° 4.339/2002) no Consema, uma vez que não se previu assento específico para o Departamento de Fomento à Proteção da Biodiversidade da CFB/SIMA ou o Departamento de Biodiversidade da CDRS/SAA. O enfraquecimento da CATI, não só pela mudança do nome para a nova CDRS, retirando o termo “assistência técnica integral” do nome da coordenadoria, mas também pelos rumores de que haverá redução de Escritórios de Desenvolvimento Regional e fechamento e/ou transferência parcial ou integral das atuais 594 Casas de Agricultura para os Municípios, irá afetar milhares de pequenos e médios produtores rurais com essa redução da assistência técnica e extensão rural. Além disso, são 52 anos de existência de uma instituição renomada e de uma marca amplamente conhecida pela sociedade, que agora perde sua identidade. O trabalho técnico-educativo da extensão rural é desenvolvido tanto pela CATI, como pela Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp), com foco principalmente na agricultura familiar. O Programa Microbacias II, o Programa Paulista de Agricultura de Interesse Social (PPAIS), o Fundo de Expansão do Agronegócio Paulista (FEAP), o trabalho de apoio técnico e social a milhares de famílias da agricultura familiar, dos assentamentos rurais e das comunidades quilombolas, além do trabalho de regularização fundiária, são alguns dos programas de excelência desenvolvidos por ambas as instituições. Negar ou esconder a excelência dos resultados alcançados serve para justificar as propostas de desmonte destas áreas. A Fundação Itesp corre o risco de ter alguns de seus escritórios regionais - Andradina, Promissão e Martinópolis, por exemplo - fechados em breve. Em relação aos institutos de pesquisa do Estado de São Paulo ligados à SAA - o Instituto de Pesca (IP) e o Instituto de Zootecnia (IZ) - o Governador e seu Secretário Gustavo Junqueira da SAA têm a proposta de extinção de ambas as instituições, por meio de uma nova organização a ser criada. A extinção do IP representa a perda de um legado construído ao longo de 50 anos. A convergência temática, por meio da fusão entre os dois Institutos, é apenas aparente, já que a produção animal aquática apresenta especificidades muito distantes das de produção animal terrestre. O IP vem atuando no desenvolvimento de tecnologias de produção do pescado marinho e de espécies de água doce e em estudos ecológicos e ambientais, colaborando com a preservação e proteção de espécies nativas marinhas e continentais. Destaca-se também a orientação e subsídios técnicos às colônias de pescadores, às universidades e aos diferentes órgãos e instituições governamentais em nível estadual e federal. Como estas duas Instituições com pesquisadores e atribuições tão distintas podem ser unificadas sem participação direta do corpo técnico? O governo estadual vem “acelerando” a precarização e o enfraquecimento de serviços ao promover uma desestruturação destas instituições, que são vagamente justificados por uma suposta economia dos recursos públicos. Tudo isso está sendo feito sem um mínimo de diálogo com os principais agentes envolvidos. Somos sim a favor de mudanças, quando elas se adequam aos novos tempos e promovem melhorias e ganhos à sociedade e ao meio ambiente, e para que isto ocorra, é necessária uma construção conjunta e participativa entre gestores, equipe técnica e administrativa e sociedade, caso contrário os cidadãos que dependem dos serviços prestados pela CATI, CBRN, Itesp, IP e IZ serão negativamente afetados. Já podemos ver as primeiras consequências negativas da falta de transparência e participação das áreas afetadas, por exemplo: na Resolução Conjunta SAA/SIMA n° 01, de 12-3-2019 que detalhou as atribuições de cada Secretaria, foi incluído erroneamente projeto que não existe mais e não foram citados projetos e assuntos em curso atualmente na SIMA. O gabinete da SAA mostrou total desconhecimento sobre as estruturas básicas - tais como computadores, configuração de rede, plataforma de sistema, veículos e armários - para o prosseguimento dos trabalhos desenvolvidos pelos departamentos transferidos. Esses problemas poderiam ter sido evitados se houvesse transparência e diálogo com a equipe técnica-administrativa das áreas envolvidas, antes da publicação dos Decretos ou da transferência das equipes, prevista para o próximo dia 25/3. Todos unidos contra o desmonte e a favor do fortalecimento da pesquisa, do desenvolvimento sustentável da agricultura, produção animal aquática e terrestre, da assistência técnica e extensão rural, da biodiversidade e meio ambiente!

São Paulo, 22 de março de 2019.

AEAESP - Associação de Especialistas Ambientais do Estado de São Paulo

EPAESP - Executivos Públicos Associados do Estado de São Paulo

APAER - Associação Paulista de Extensão Rural

APqC - Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo

Apoio: Mais Florestas PRA São Paulo

Carta disponível no link: https://www.aeaesp.org.br/ Quer apoiar esta carta? Escreva para especialistasambientais@gmail.com

12 março 2019

Diálogos Envolverde Economia Circular

Vivemos num mundo finito e, portanto, nada mais lógico do que fazermos uso de nossos recursos de maneira, não só, com o objetivo de prolongar a sua vida útil, mas de recolocar materiais e insumos de volta à cadeia produtiva. A máxima de Lavousier deve ser vista como algo essencial à nossa existência: “Nada se cria, tudo se transforma”. Mas infelizmente, a economia tradicional tem demorado a compreender os impactos causados pela crescente insustentabilidade dos negócios e muitos problemas ligados à produção, descarte e desperdício tem alcançado proporções alarmantes. O Diálogos Envolverde – Economia Circular vai debater os novos caminhos que podem e devem ser trilhados com a máxima urgência.


DATA: 28 de MARÇO de 2019

HORÁRIO: 10h às 13h

LOCAL: UNIBES CULTURAL

Rua Oscar Freire 2500 - ao lado do metrô Sumaré

REALIZAÇÃO Instituto Envolverde

INSCRIÇÃO GRATUITA

PROGRAMAÇÃO

10h00   Abertura

10h10   Apresentação de Projetos Relevantes

Jamile Balaguer Cruz - diretora Biocicla

Delaine Romano - Coordenadora do Fórum Lixo e Cidadania do Estado de São Paulo

10h30   Roda de Conversa

              - Cláudia Leite - Gerente de Cafés e Sustentabilidade da Nespresso

              - Guilherme Brammer - Fundador e CEO da Boomera

                Mediação: 

              - Dal Marcondes - jornalista, presidente do Instituto Envolverde

              - Reinaldo Canto - jornalista, vice-presidente do Instituto Envolverde

13h00    Encerramento


RSVP

Ana Maria Vasconcellos

e-mail: dialogos@envolverde.com.br

Telefone: 11 945 327 415

                      


04 março 2019

APOSTA EM ENERGIA SUSTENTÁVEL GERA ECONOMIA E RENDE PRÊMIOS

Histórias de empresários que investiram em energia solar e mudaram seus negócios

Por Reinaldo Canto
Aproveite antes que acabe! Esse bem que poderia ser o slogan para estimular os que ainda têm dúvida em relação às vantagens de se adotar a sustentabilidade como um ganho consistente para os negócios. Tudo bem que não são todos os casos em que as vantagens são instantâneas, mas no campo da energia e, principalmente, a solar, não há razões para não se buscar essa fonte como opção por energia de baixo impacto ambiental (limpa e renovável), fácil instalação e, quase sempre, apresentando uma importante redução nos custos financeiros. Pois além desses fatores já suficientes para uma decisão de mercado, que tal ainda ser possível obter ganhos em reconhecimento, imagem e até prêmios?
Recentemente conheci dois projetos ligados à energia solar que tiveram resultados bastante gratificantes para os empresários que decidiram adota-la.

Título de Cidadão

Há cerca de 10 anos, o empresário Francisco Edival Gonçalves Freires decidiu abrir o Hotel Tropical para aproveitar a vocação de turismo de negócios em sua cidade, Nova Andradina, no Mato Grosso do Sul (cerca de 300 quilômetros da capital Campo Grande). Logo Edival percebeu que o calor local seria um fator de grande consumo de energia dos seus cerca de 500 hóspedes mensais no uso de ar condicionado em seus 26 quartos, isso sem contar outros consumos cotidianos como os de frigobar, chuveiro elétrico, aparelhos eletrônicos e iluminação.
Uma conta de energia de quase três mil reais todos os meses foi um fator fundamental para que o empresário pensasse na solução solar para o hotel. O sol que não falta nessa região do Centro-Oeste é um argumento pra lá de inquestionável: “Quando comecei o negócio já tinha pensado nesse caminho, mas era muito caro”, explica Edival. O constante barateamento da energia solar o convenceu da viabilidade do investimento.
Um projeto da empresa NeoSolar para a instalação de 97 placas solares acompanhadas de uma convidativa linha de crédito do FCO (Fundo de Financiamento do Centro-Oeste) do Banco do Brasil tornaram realidade a geração de 3.700 kWh consumidos mensalmente pelo hotel. O melhor: não houve necessidade de desembolso de capital, pois com o valor economizado foi possível pagar a prestação. “Tem gente que pensa que é um negócio complicado, mas com uma instalação de boa qualidade, bem feita, os resultados são imediatos”, conclui o proprietário do hotel.
Bem, só isso já seria suficiente para a satisfação do empresário, mas graças ao fato de ter sido o primeiro a usar energia solar na hotelaria da cidade, Edival passou a ser referência, inclusive para as escolas e os estudantes da região que de tempos em tempos realizam visitas monitoradas ao hotel. E não foi só isso, o empreendedorismo ainda lhe rendeu uma homenagem na Câmara Municipal de Nova Andradina.

Premiação e reconhecimento

Outro exemplo interessante é o de Luiz Claudio Dutra, proprietário da Bavep Barretos, concessionária da General Motors há 46 anos na cidade do interior paulista. Diante de uma conta de energia variando entre cinco e sete mil reais mensais e um consumo próximo de 9 mil Kwh, a opção pelo projeto solar não foi difícil. “Fizemos a instalação em setembro de 2017 e nossa conta já caiu para cerca de 200 reais por mês”, conta Luiz. 260 placas interligadas garantem o abastecimento da concessionária que comercializa em média 100 veículos novos e 60 usados todos os meses. O financiamento, segundo o empresário, não teve vantagens adicionais por contemplar instalação de energia limpa e renovável. Mesmo assim, será pago em 48 meses ou quatro anos.
Para a revendedora de veículos um bom negócio que, além da questão puramente financeira, ainda colheu frutos sendo contemplada com Prêmio Sustentabilidade 2018 concedido pela montadora General Motors pelo projeto Sistema de micro geração distribuída de Energia Fotovoltaica.



Que sirvam de exemplo para que novas iniciativas sustentáveis do setor privado sejam capazes de tirar outras empresas da falsa sensação de conforto, pois os custos, entre outros, da energia, água e matérias primas só tendem a crescer. Isso para não falarmos da necessidade urgente de combate às mudanças climáticas e ao aquecimento global. Desenvolvimento sustentável é o único caminho possível para que possamos continuar a habitar este planeta.

26 fevereiro 2019


São Paulo ainda patina no setor ambiental  

É preciso preservar conquistas e avançar na regulamentação em prol de todos os paulistas

A gestão Dória prega o desenvolvimento e a modernização nas relações do setor público com a sociedade, mas na área ambiental ainda precisa mostrar quais objetivos quer atingir. Entre outras questões fundamentais, São Paulo precisa manter o papel de protagonista que sempre teve no cenário nacional com relação às políticas ambientais.
Infelizmente, mesmo durante o período das eleições de 2018, o então candidato João Dória não havia apresentado um posicionamento claro quanto às pautas ambientais em seu plano de governo, deixando de apresentar posicionamento para oitos dos pontos priorizados,  expressando seis citações genéricas e apenas uma posição afirmativa.
O governo, até o momento, tem mantido uma atuação semelhante a da campanha, ainda sem o aprofundamento que as principais questões merecem, além da falta de informação quanto ao seu projeto ambiental para São Paulo.
Essas ausências preocupam as organizações que há décadas atuam no setor, pois temem retrocessos aos muitos programas anteriormente sob a gestão  da Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo (SMA), criada mesmo antes da existência de um Ministério para tratar de questões ambientais no âmbito federal.
A atual administração, até então, teve como única medida concreta  promover uma reestruturação administrativa para integrar as Secretarias de Meio Ambiente, do Saneamento e Recursos Hídricos (SRH) e da Energia e Mineração (SEM), formando a Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente (SIMA).
Mesmo as diretrizes quanto às ações dessa super e inflada Secretaria ainda não foram apresentadas à sociedade. A própria nomeação de seus  subsecretários - de Meio Ambiente e de Infraestrutura -  só se deu 30 dias após a criação dos cargos, em 30 de janeiro.
Essa fusão é justificada pelo governo sob o  argumento de otimizar a máquina pública para poupar recursos, mas ela ignora os conflitos de interesses inerentes às agendas das antigas Secretarias, incluindo submeter a mesma coordenação as atribuições de requerer e expedir licenças ambientais para obras de infraestrutura, por exemplo.
Embora o decreto estadual que promoveu tais mudanças precise ser analisado com mais detalhes, é possível que hajam questionamentos quanto a sua constitucionalidade. A norma fala claramente da criação da SIMA e "desativa" algumas Secretarias anteriormente existentes, incluindo as de Saneamento e Recursos Hídricos e a de Energia e Mineração.
O Governador está autorizado a dispor, mediante decreto, sobre a organização e funcionamento da administração estadual. Porém, existem limites ao exercício dessa competência, já que essas disposições não podem implicar em aumento de despesa, nem criação ou extinção de órgãos públicos.
O modo como as atribuições das pastas integradas e desativadas foram recepcionadas pela nova estrutura não está completamente claro. Nesse momento, inclusive, aguarda-se um novo ato normativo do Governador para complementação do desenho institucional da Administração Pública paulista na gestão Dória e, enquanto isso, o futuro do sistema de gestão ambiental estadual ainda é incerto.
Outra preocupação trazida por essa  morosidade é a paralisação, até agora, das atividades  do Conselho Estadual de Meio Ambiente (CONSEMA), órgão normativo e recursal, integrante do Sistema Ambiental Paulista, que tem sua existência e atuação assegurada pela Constituição Estadual. Uma instância pioneira no Brasil, uma vez que sua criação antecedeu à da própria Secretaria de Meio Ambiente.
No dia 31 de outubro do ano passado, os novos representantes da sociedade civil no CONSEMA foram eleitos para o mandato que deveria ter iniciado em janeiro de 2019, mas eles ainda não foram nomeados e, portanto, não podem assumir seu papel. Os antigos representantes tampouco foram recrutados para  dar continuidade ao funcionamento desse colegiado, o que já aconteceu em outras  transições de governo sem que houvesse demora como a que vem ocorrendo neste momento.
O CONSEMA realiza ao menos uma reunião ordinária por mês e, pela primeira vez em muitos anos, as reuniões mensais previstas para janeiro e fevereiro não ocorreram. A justificativa é a reforma administrativa. Porém, dentre as atribuições deste Conselho, estão justamente: “emitir pronunciamento prévio a respeito da Política Estadual do Meio Ambiente e acompanhar sua execução”, além de “avaliar as políticas públicas com relevante impacto ambiental”. Assim, a ausência de manifestação do CONSEMA, no contexto atual, fere disposições legais.
Outro ponto muito preocupante é a perspectiva de mudança da gestão dos assuntos ligados  a regulamentação e implementação do Código Florestal em âmbito estadual, que, em sua maior parte, eram de atribuição da SMA, mas que, agora, parecem estar migrando por completo para a Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA). Essa mudança ainda incerta, é divulgada nos bastidores do governo como uma inovação, mas novamente acontece sem nenhum debate público e sem uma justificativa consistente.
Importa ressaltar que a Secretaria de Meio Ambiente era o órgão protagonista das políticas ambientais do Estado de São Paulo, com papel central na construção e implementação de diversas políticas públicas, a começar por aquela instituída pela  Lei 9.509 de 1997.  Atuava, ainda, como líder e protagonista de diversos compromissos e acordos ambientais assumidos pelo Estado. Portanto, é imperativo, particularmente em tempos de crise climática, que a sociedade paulista seja ouvida antes de se modificar este arcabouço institucional.
É temerário modificar a estrutura da Administração Pública, com a criação e extinção de órgãos, e diretrizes institucionais sem um debate público com os representantes do Legislativo paulista e da sociedade civil, especialmente com  o próprio CONSEMA.
Evidente que não se trata de questionar a competência técnica dos outros órgãos, nem da SAA, nem tampouco daqueles que integram as antigas Secretarias do Saneamento e Recursos Hídricos (SRH) e da Energia e Mineração (SEM), mas frisar que o atendimento à legislação ambiental estadual vem sendo ao longo dos anos garantido pela estrutura e funcionários da agora ex-SMA.
A lentidão apresentada até o momento pelo Governo para traçar as diretrizes mínimas que irão orientar o trabalho dos órgãos estaduais na área ambiental traz enormes preocupações. Ela dificulta a transparência necessária para o posicionamento dos diversos atores da sociedade civil sobre os rumos que estão sendo definidos para políticas públicas ambientais chaves tanto para o Estado como para o país, entre estas aquelas relacionadas a florestas, áreas protegidas e mudanças climáticas
Também suscita dúvidas sobre a permanência de compromissos internacionais assumidos pelo Governo de São Paulo em gestões anteriores, já que, durante sua campanha, o atual Governador chegou a manifestar que esses não seriam cumpridos ou mantidos.
Por exemplo, o Estado de São Paulo na COP 21, em Paris, se comprometeu com a adesão à Iniciativa 20×20 que prevê o compromisso de promover a restauração de 300 mil hectares até 2020. O déficit de vegetação nativa, na maioria das regiões do Estado, prejudica a manutenção da biodiversidade e a prestação de serviços ambientais, além de impactarem negativamente os recursos hídricos e as possibilidades de mitigação e adaptação aos efeitos das mudanças climáticas. Sem a implementação efetiva da Lei Florestal, incluindo a restauração de APPs e Reservas Legais, esta meta não será alcançada e atuação em âmbito estadual pode impactar significativamente esse resultado.
Vale lembrar que, a Lei e outras normas estaduais que tratam do Programa de Regularização Ambiental de São Paulo (PRA-SP) encontram-se suspensas. No entanto, como já vinha sendo realizado pela antiga SMA e representantes da sociedade civil, é de grande importância que os órgãos públicos ambientais competentes mobilizem esforços para agilizar a "liberação" e implementação do PRA, instrumento de grande importância não só para conservação da biodiversidade, mas para a produção rural sustentável no país.
O manejo sustentável da vegetação nativa e direitos dos povos e comunidades tradicionais também ficam prejudicados diante do atual contexto. E estes assuntos dependem da definição de atribuições dos órgãos responsáveis e de discussões sobre a regulamentação do Código Florestal.
Assim, reivindicamos que:
·         Seja mantida a separação de competências entre Secretarias no que tange à política ambiental, em especial ao licenciamento ambiental;
·         Seja mantido o protagonismo do órgão ambiental na gestão dos instrumentos da Lei Florestal, como o CAR e o PRA;
·         O CONSEMA (re)assuma seu papel central na política ambiental, a começar pela nomeação dos novos conselheiros e retomada das reuniões;
·         As alterações das estruturas e competências dos órgãos ambientais sejam feitos atendendo os princípios da legalidade, publicidade e transparência;
·         Sejam mantidas e aprimoradas as conquistas ambientais do Estado de São Paulo que sempre teve um papel de vanguarda no cenário brasileiro.
Todas estas questões são partes integrantes e indispensáveis ao desenvolvimento de São Paulo e estão sendo atentamente observadas para garantir que não tenhamos retrocessos socioambientais escondidos sob um argumento desenvolvimentista que não se justifica mais nem a curto nem a longo prazo.

Coletivo Mais Florestas PRA São Paulo

Rede de ONGs da Mata Atlântica


24 fevereiro 2019

Do flagelo ao empreendedorismo: Encontro Nacional revela um semiárido brasileiro repleto de projetos inovadores

Por Reinaldo Canto, de Juazeiro do Norte, especial para a Envolverde*
Se antes, num passado não tão distante o Semiárido brasileiro, que engloba os biomas Caatinga e Cerrado, presente nos estados nordestinos e em parte de Minas Gerais, era visto por muitos como um problema para a sobrevivência de populações humanas e um desafio intransponível para a agricultura, o que temos hoje, é uma outra realidade. Bons projetos acompanhados do essencial abastecimento de água garantido pelas cisternas, coloca o agricultor do semiárido num outro patamar, indo  muito além da subsistência para tornar-se um empreendedor.
Essa é uma das muitas conclusões que pudemos tirar do V Encontro de Agricultoras e Agricultores Experimentadores, realizado pela ASA – Articulação Semiárido Brasileiro, na semana passada em Juazeiro do Norte (cidade cearense localizada à mais de 490 Kms da capital Fortaleza). Cerca de 250 participantes de 10 estados representando comunidades de todo o Semiárido trocaram experiências, relataram suas conquistas e desafios, mas principalmente sua enorme e inquebrantável disposição para lutar e trabalhar por suas terras e por seu modo de vida tradicional.
Ali a defesa de uma agricultura familiar baseada no sistema agroflorestal e no uso de espécies nativas e sementes crioulas, as de origem local mais adaptadas às condições do território, foram unânimes.
O Semiárido ocupa uma área de 1 milhão de km² e nele vivem cerca de 25 milhões de pessoas com experiências e vivências riquíssimas que por gerações desenvolveram conhecimentos imprescindíveis para o desenvolvimento local e a qualidade de vida das famílias de agricultores. E, nada melhor do que compartilhar essa história para que outros possam também usufruir dessa sabedoria. Por essa razão, o tema do encontro foi “Diálogo entre a sabedoria popular e a ciência para a construção dos conhecimentos para a convivência com o Semiárido“,  e que não deixa de ser uma provocação para muitos que desdenham da sabedoria do povo e colocam à ciência formal e acadêmica em um patamar superior.
As Mulheres no Comando
Outro ponto fundamental presente ao encontro é o do protagonismo feminino, “construímos nosso empoderamento por meio das nossas experiências com as espécies nativas , do nosso conhecimento das plantas medicinais, dos chás do nosso entorno”, afirma Maria do Céu, agricultora de Soledade na Paraíba. Para ela, a visão e sensibilidade feminina somadas a muita luta tem contribuído para mudar a realidade das mulheres do Semiárido, “construímos e fizemos todas as lutas e também construímos muita, muita solidariedade”, completa a agricultora paraibana. Mesmo com muitos avanços na construção dessa autonomia feminina para a geração de renda familiar essa batalha ainda está longe de ser vencida, como relataram várias agricultoras, que convivem diariamente com os efeitos nefastos do machismo, infelizmente, que permanece enraizado em muitas regiões do país.
O outro protagonismo é o das cisternas
De toda forma muitas dessas conquistas só foram possíveis graças às sempre presentes cisternas, capazes de armazenar água para o consumo das famílias (cisterna de 1ª água) e a produção de alimentos e criação de animais (cisterna de 2ª água).
Num passado não tão distante antes do projeto 1 milhão de cisternas iniciado no Governo Lula, a seca condenava o sertanejo a abandonar frequentemente às suas terras para sobreviver migrando para outras regiões ou participando das famigeradas frentes de trabalho. Hoje as frequentes estiagens são contornadas graças ao abastecimento de água garantido pelas cisternas.
Água e Empreendedorismo
Só dessa maneira é possível surgir empreendedores como o casal Francisco Batista dos Santos Filho e Antônia Fabiana dos Santos da comunidade Zambelê, na cidade de Nova Olinda. Nos 5,5 hectares de sua propriedade além de plantar alimentos como feijão, macaxeira e milho, eles produzem farinha e goma da mandioca e também buscaram a diversificação com a produção de mel em suas 34 colmeias da abelha melípona (espécie nativa e sem ferrão) e também algumas da abelha italiana (essa já uma espécie exótica com ferrão). Francisco fez diversos cursos de apicultura para se capacitar corretamente para a produção do mel e hoje é um dos mais ativos participantes da Associação dos Apicultores de Nova Olinda. “Estou sempre procurando aprender mais para melhorar a produção do mel”, explica Francisco. No total ele emprega oito pessoas na propriedade.
Esse é apenas um exemplo dos potenciais do Semiárido brasileiro e de seu povo criativo e empreendedor. Se com esse pouco eles já conseguem fazer muito, imaginem o que não será possível com um apoio permanente?
A valorização da agricultura familiar e de uma produção sustentável que respeite o meio ambiente é um dos melhores e mais consistentes caminhos para o desenvolvimento da região e para a qualidade de vida desses corajosos brasileiros e brasileiras .
*O jornalista viajou a convite da ASA
(#Envolverde)

14 janeiro 2019

NO MEIO AMBIENTE, A LEVE SENSAÇÃO DE UMA VOLTA AO PASSADO - CARTA CAPITAL