06 junho 2014

Meio Ambiente: falta conexão entre o óbvio e o ululante

No dia do meio ambiente, talvez seja mais importante refletir sobre os nossos hábitos do que simplesmente plantar uma árvore

Por Reinaldo Canto*


O polêmico dramaturgo Nelson Rodrigues foi quem cunhou a expressão que emoldura o início desse artigo. No discurso rodriguiano, óbvio e ululante fazem referência às verdades escancaradas. Aquelas do tipo que não deixam espaço para dúvidas. Do mesmo modo, Mino Carta, diretor e editor destaCartaCapital costuma sempre mencionar o conhecimento “até do mundo mineral” para as questões já amplamente reveladas.
Todos os anos, neste começo de junho, são realizadas inúmeras ações e eventos para comemorar o dia do meio ambiente (05/06) ou a semana do meio ambiente. Governos de todas as esferas correm para inaugurar praças, divulgar algum programa ambiental e colocar estudantes de escolas públicas para plantar algumas árvores. Empresas apresentam números vinculados à redução de emissões de gases de efeito estufa e impactos ambientais de suas atividades, informam sobre a economia cada vez maior no uso da água e da energia e colocam os filhos de seus colaboradores para... plantar algumas árvores.  As pessoas e seus familiares e amigos também aproveitam para celebrar a data participando de atividades públicas, visitar algum parque e...plantar algumas árvores.
Sei que usei de ironia para comentar essas atitudes, mas não as considero negativas, muito pelo contrário. Elas devem ser divulgadas e incentivadas. O que questiono, e peço ao leitor para fazer o mesmo, é se em muitos desses casos tais ações não possuem um caráter apenas pontual.
Mais do que digna de comemoração, a data deveria servir, exatamente, para uma profunda reflexão acompanhada de importantes e óbvias perguntas que, infelizmente, não recebem da mesma maneira respostas ululantes. Daí em citar que, a obviedade gritante dos problemas ambientais não recebe o seu correspondente e ululante caminho de soluções permanentes.
Se não vejamos: em muitas regiões do país o problema da falta de água preocupa a todos, causando inclusive a paralisação de processos produtivos de indústrias; o uso excessivo de agrotóxicos contamina pessoas e o solo, o que ameaça a nossa produção de alimentos no longo prazo; a gestão de lixo nas cidades é cada vez mais cara e o seu descarte seja em aterros sanitários ou pior em lixões apresenta um cenário de colapso; as nossas florestas estão sendo destruí das, muitas vezes para transformar árvores em carvão ou para pastos com meia dúzia de cabeças de gado, em áreas antes ocupadas por nascentes de rios e uma rica biodiversidade, o que compromete o nosso futuro.
Essas e outras obviedades ambientais são de “conhecimento do mundo mineral”, mas mais uma vez, no quesito ululante permanecem no vazio da letargia e da procrastinação. Mesmo com tantas evidências parece faltar algo para que se entenda de uma vez por todas a necessidade de mudar um sem número de atitudes, em todos os níveis, que deixadas ao bel prazer, fatalmente vão trazer ainda maiores dissabores e problemas mais crônicos com crescente dificuldade de solução.
Ao menos se começarmos a quebrar alguns paradigmas como a percepção de que os recursos naturais são infinitos e a natureza descartável, já será um progresso considerável. Parece que tudo aquilo que gentilmente nos é entregue pelos chamados serviços ambientais, tais como, as propiciadas pelas florestas e áreas verdes por meio da regulação climática, conservação e purificação das fontes de água, dos regimes de chuva, da qualidade do ar e dos fundamentais insumos para nossa sobrevivência (frutas, madeira, insumos medicinais  e essências, por exemplo), não recebe o devido valor.
Na mesma linha de raciocínio, com o surgimento das cidades, o meio natural muitas vezes foi e ainda é visto como atraso. Claro que existe uma razão para isso. Uma rua sem asfalto, um matagal perto de casa e a proliferação de insetos na maioria dos casos pode estar associados a uma condição social desfavorável. Por outro lado, usar a bicicleta ao invés de um carro, resistir aos apelos de consumo dos últimos lançamentos tecnológicos ou mesmo reutilizar produtos e embalagens ainda é visto como sinal de pobreza ou de uma questão puramente de pãodurismo. Se até mesmo andar a pé, uma das mais básicas atividades físicas é, às vezes, visto como coisa de pobre, o que esperar do futuro?
Se nesses dias de comemoração você havia decidido plantar uma árvore, não deixe a pá de lado por causa dessas inconclusivas linhas. Uma árvore é sim relevante e, certamente, trará seus benefícios. Mas tão importante quanto, é exercitar nosso poder de refletir mais profundamente sobre o significado do meio ambiente. Quem sabe um olhar mais terno, generoso e cúmplice para as coisas da natureza seja capaz de colocar o óbvio e o ululante lado a lado em prol de um mundo mais justo, equilibrado e sustentável para todos nós.

* Artigo publicado originalmente na coluna do autor no site da revista Carta Capital: http://www.cartacapital.com.br/

Reinaldo Canto é jornalista, consultor e palestrante. Foi diretor de Comunicação do Greenpeace e coordenador de Comunicação do Instituto Akatu. É colunista da revista Carta Capital, da Rádio Trianon, do Portal Mercado Ético, colaborador da Envolverde, comentarista da Rede Vida e professor de Gestão Ambiental na FAPPES. 

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05 junho 2014

Iniciativa Verde assina Carta da Mata Atlântica 2014



No sábado, 24/05 durante a realização da 10ª edição do Viva a Mata foi lançada a carta que elenca 10 ações urgentes e fundamentais para reverter as agressões e proteger o bioma.
Tendo como alvo principal os candidatos às eleições deste ano, as autoridades públicas e a sociedade em geral, a Carta foi elaborada pelas entidades participantes da Rede de ONGs da Mata Atlântica e da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica. A Iniciativa Verde é uma das organizações com atividade permanente na Rede e também uma das signatárias do documento. Veja a íntegra:
Carta da Mata Atlântica 2014
A Mata Atlântica é o bioma mais ameaçado do Brasil e o segundo do Planeta, globalmente reconhecido como prioridade para ações de conservação da biodiversidade, dos serviços ambientais e demais recursos naturais. Isso acontece não apenas por sua sociobiodiversidade inigualável, que está desaparecendo, mas também por sua importância para a manutenção da qualidade de vida de mais de 60% da população brasileira que habita seu território.
A deterioração do bioma, causada por um modelo de desenvolvimento que privilegia grandes projetos públicos e privados, planejados e implementados sem os devidos cuidados socioambientais, gera problemas como a perda de biodiversidade e dos serviços ambientais prestados pelos ecossistemas, como a regulação da quantidade e da qualidade da água.
O resultado mais visível dessa situação hoje na Mata Atlântica é a ocupação indiscriminada de morros e áreas de mananciais. Com isso, a população passa a conviver com enchentes e desabamentos em épocas de fortes chuvas e falta de água em tempos de seca, entre muitos outros problemas. Um retrospecto recente das consequências disso vai desde perdas econômicas – em um território que corresponde a 70% do PIB brasileiro - e de qualidade de vida nas cidades, até perdas de vidas humanas.
É por isso que a situação crítica da Mata Atlântica tem mobilizado diversos setores da sociedade, que exigem ações e políticas capazes de assegurar sua conservação e restauração. No entanto, na contramão das necessidades, estamos vivenciando um grande retrocesso na política socioambiental brasileira, que impacta negativamente tanto a Mata Atlântica como os demais biomas presentes no país.
Nesse contexto, nós, da Rede de ONGs da Mata Atlântica e da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, apresentamos dez ações fundamentais e emergentes para reversão das degradações e proteção do bioma.
  1. Retomar a agenda de criação e implantação de áreas protegidas;
  2. Regulamentar o Fundo de Restauração da Mata Atlântica (previsto em lei há oito anos);
  3. Estruturar de maneira adequada os órgãos responsáveis pelo cumprimento do Código Florestal brasileiro (em vigor há dois anos);
  4. Implantar, de forma qualificada, transparente e com participação social, os instrumentos do Código Florestal brasileiro, como o Cadastro Ambiental Rural, a restauração florestal e os incentivos econômicos e fiscais, para a sua total efetivação;
  5. Estabelecer um marco legal sobre Pagamento por Serviços Ambientais, em consonância com o Código Florestal brasileiro e propor a criação de leis e programas similares nos estados e municípios;
  6. Criar programas, em âmbito federal e estaduais, de fomento a elaboração e implementação dos Planos Municipais de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica;
  7. Rearticular e fortalecer o Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama) como principal instrumento de gestão da política ambiental nacional, com participação e controle social;
  8. Estabelecer um plano de ação para o cumprimento e monitoramento das Metas da Convenção da Diversidade Biológica (Metas de Aichi), voltadas para conter as perdas de biodiversidade no bioma, envolvendo e fomentando os estados e diversos seguimentos da sociedade;
  9. Promover ampla discussão com a sociedade sobre megaempreendimentos, públicos e privados, que impactam o bioma;
  10. Integrar as Políticas Públicas, nas três esferas da federação, tais como recursos hídricos, meio ambiente, agroecologia e mudanças climáticas, para a conservação e preservação do bioma.
Contato com a Imprensa: 
Reinaldo Canto
imprensa@iniciativaverde.org.br
11 3647-9293 e 11 9 9976-1610