31 julho 2012

O SAGRADO DIREITO DE CONSUMIR O PLANETA II



Por Reinaldo Canto*

É realmente incrível como muitas pessoas se mostram indignadas quando se discute a cobrança pelo uso da sacolinha plástica ou mesmo o fim da sua comercialização.
Como afirmei em artigo anterior sobre o tema, sacola plástica é apenas um símbolo, caráter meramente ilustrativo de uma era na qual o consumismo exacerbado entorpece os corações e mentes das pessoas. Muitos confundem o uso desse artigo de uso banal com direitos fundamentais e inalienáveis a ser defendido em trincheiras e a força de baionetas.
Por mais que tenha ressaltado a pouca relevância que o banimento ou não das sacolinhas teria sobre os verdadeiros embates, aliás inadiáveis, relacionados à proteção ao meio ambiente, alguns comentários fizeram questão de afirmar o contrário. Disseram ser uma “falácia”, entre outras adjetivações diante de tantos produtos embalados com matéria plástica.
Para essas pessoas parece que vivemos num mundo em que o cidadão/consumidor age da maneira mais correta possível, sendo responsável, consciente e cumpridor de seus deveres. Diante de tantas virtudes, nada mais lhe caberia fazer. E, se problemas existem, todos eles residem nos governos corruptos e nas corporações gananciosas.
Não seremos nós, pessoas de bem, que deveríamos abrir mão do mínimo que seja para forrar ainda mais os bolsos já cheios dos grandes exploradores.
São também os mesmos que defendem, até mesmo com lágrimas nos olhos, os direitos dos mais pobres, como afirmou esse leitor: “vá até a periferia de São Paulo e veja nos supermercados como ficou a vida daqueles que fazem suas compras e não dispõem de automóveis para o transporte dos produtos”.  Quer dizer que além de não lhes darem carros ainda tiram dos mais pobres as sacolinhas? Essa é realmente uma maldade acima do aceitável!
A confusão entre direitos sociais e consumo se amplia exponencialmente quando acreditamos que todas as pessoas, além do divino direito as sacolas plásticas, faz jus também a um carro. As cidades brasileiras, grandes e médias, já não suportam tantos veículos de transporte individual. Estamos desfigurando a paisagem urbana, gastando milhões, bilhões para fazer frente a uma realidade impossível de se perpetuar.  O real direito de ir e vir com segurança, comodidade e rapidez é substituído pelo transporte próprio que, na maioria dos casos, não garante os direitos descritos anteriormente e além do mais custa muito caro.  
Nada mais desonesto do que afirmar a pureza de uma sociedade longe que está de adotar as melhores práticas de convivência civilizada, harmoniosa e solidária. Tratamos os espaços públicos como terra arrasada, jogamos lixo nas ruas, rios e lagos, inclusive as sacolinhas que angelicalmente, todos afirmam armazenar seu lixo.
Vivemos durante longo período uma triste e cruel ditadura responsável pela supressão de direitos, aí sim fundamentais. Tudo era imposto de cima para baixo e a sociedade estava à mercê de grupos encastelados no poder e determinando o que se podia ou não fazer.
 Hoje não temos mais essa ditadura, mas interesses de alguns continuam a prevalecer sobre os da maioria. Agora, é preciso entender que se queremos usufruir de direitos é necessário também sermos responsáveis.

São Paulo Insustentável

A nova realidade de uso indiscriminado dos recursos naturais coloca em cheque um estilo de vida perdulário e injusto. Sacolas plásticas, carros, lixo, poluição, contaminação, estresse,  consumismo, obesidade e tantas outras questões relativamente novas são alguns nomes e símbolos dos enormes desafios da sobrevivência que estão colocados, gostemos ou não deles.
Recente estudo da organização não governamental WWF (World Wildlife Fund) com a consultoria Ecossistemas concluiu que o paulistano tem um estilo de vida insustentável.  Isso significa que se todos os habitantes do planeta tivessem o mesmo que os habitantes da capital paulista seriam necessários 2,5 planetas.  Para essa conclusão são levadas em conta as emissões de carbono, hábitos alimentares, como o de comer carne, moradia, lazer e consumos diversos.
Uma situação típica em que direitos e deveres são colocados lado a lado.  Não podemos abrir mão de sermos protagonistas nessa discussão. Qual o meu direito de comprometer o futuro dos meus filhos, da minha cidade e do meu planeta?  Com a palavra o leitor/eleitor/cidadão/consumidor.

*Reinaldo Canto é jornalista, consultor e palestrante. Foi diretor de Comunicação do Greenpeace e coordenador de Comunicação do Instituto Akatu. É colunista da revista Carta Capital, colaborador da Envolverde e professor de Gestão Ambiental na FAPPES.

Artigo publicado originalmente na coluna do autor no site da revista Carta Capital:
 http://www.cartacapital.com.br/sociedade/o-sagrado-direito-de-consumir-o-planeta-2/?autor=599
Blog: cantodasustentabilidade.blogspot.com
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03 julho 2012

O SAGRADO DIREITO DE CONSUMIR O PLANETA



Por Reinaldo Canto*

A farra das sacolas plásticas está de volta por decisão da Justiça

Para alegria de muitos, a obrigatoriedade da entrega gratuita e indiscriminada das famigeradas sacolinhas plásticas nas redes varejistas de São Paulo retorna por determinação legal.
Nesse novo round, a Justiça invalidou o acordo firmado entre o Governo Estadual e a Associação Paulista de Supermercados (APAS), que previa a cobrança pelas sacolas no ato da compra. A Associação prometeu recorrer, mas afirmou que irá cumprir a determinação.
A Justiça levou em conta argumentos como o de direito adquirido anteriormente pelos consumidores e os lucros financeiros com a venda das sacolas que já eram embutidos nos preços dos produtos.
Quanto ao segundo argumento nada a contestar, acredito realmente que seria justo  debater essa questão e achar uma alternativa não lesiva aos consumidores. As sacolas “gratuitas” eram realmente uma ilusão, o consumidor sempre pagou por elas, mesmo sem saber disso.
Agora, quanto a um direito adquirido, isso é no mínimo, algo difícil de aceitar! O Código de Defesa do Consumidor brasileiro é um dos mais avançados do mundo e possui em seus artigos um arcabouço legal de proteção aos direitos das pessoas, dos consumidores contra a ganância, a irresponsabilidade e o poder econômico de empresas e governos, na venda de produtos e na prestação de serviços. Por outro lado, é preciso também entender que os consumidores, antes de tudo cidadãos, possuem também responsabilidades.
As sacolas plásticas são simbólicas nesse sentido. Se ao mesmo tempo os consumidores podiam e novamente podem adquirir quantas delas achar necessário, eles também se sentem no direito de descarta-las como e onde considerarem convenientes. Afinal, esse consumidor não paga impostos?
A falsa sensação da “sacolinha grátis” sempre fez com que esse artigo banal de consumo não tivesse valor nenhum. Por essa razão, são inúmeros os exemplos de sacolas “jogadas” em qualquer lugar. Muitas delas podem ser vistas cotidianamente e sem nenhum esforço, basta olhar a sua volta, nos rios, mares, ruas e praças.  Foram, por acaso, os marcianos que as deixaram nesses locais? Não, foram os consumidores que possuem direitos inalienáveis de fazer o que bem entenderem com elas.
Aos sempre indignados com quaisquer mudanças que firam o ciclo insano do consumismo, poderão afirmar não desprovidos de alguma razão, que tal proibição não resolve nossos problemas de geração de lixo, de poluição e que existe uma infinidade de produtos embalados em plástico pelos próprios fabricantes, etc, etc...
Tudo isso é verdade! O que não altera a urgente necessidade de mudanças na maneira como consumimos. A restrição no uso indiscriminado de sacolinhas plásticas tem um caráter eminentemente simbólico e, bem ou mal, o consumidor já tentava se adaptar a uma nova realidade com o uso de sacolas retornáveis. A Justiça freiou esse processo, no meu entender de modo pouco inteligente.
Muitas outras ações precisarão ser tomadas e implementadas com urgência, pois nossos problemas ambientais só tendem a crescer de maneira exponencial nos próximos anos. Se formos contar com a boa vontade das pessoas e a conscientização voluntária, estamos condenados a acelerar cada vez mais a destruição dos nossos recursos. É preciso dar passos rápidos no caminho para um mundo menos insustentável.
A questão é não ser possível acreditar que está tudo bem se a cada dia surgem novas informações colocando mais e mais pressão sobre o planeta. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) calculou que a humanidade consumia em 2005, 60 bilhões de toneladas de recursos anualmente. Isso dá um consumo de 9 toneladas para cada habitante do planeta.  De lá pra cá, não é preciso ser especialista, esses números só podem ter crescido.
Novamente espero a manifestação daqueles revoltados que ficam aboletados em suas poltronas prontos a criticar sem propor absolutamente nada: - Quer dizer que você acredita que acabar com as sacolas plásticas vão resolver todos os nossos problemas!
Se tivermos sempre a atitude de contestar qualquer medida de limitação aos nossos insustentáveis hábitos de consumo e tudo for visto como algo que: irá ferir direitos e confortos pétreos e imutáveis, isso irá significar que num futuro pouco distante, vamos conviver com restrições ainda mais severas. Elas, invariavelmente, deverão ser tomadas de cima para baixo, impostas arbitrariamente e penalizando, como sempre, primeiro os mais pobres.
Pense nisso e enxergue um pouco além das sacolas plásticas. O problema é muito maior que o plástico, mas também passa por ele! 

*Reinaldo Canto é jornalista, consultor e palestrante. Foi diretor de Comunicação do Greenpeace e coordenador de Comunicação do Instituto Akatu. É colunista da revista Carta Capital, colaborador da Envolverde e professor de Gestão Ambiental na FAPPES.

Artigo publicado originalmente na coluna do autor no site da revista Carta Capital: http://www.cartacapital.com.br/sociedade/o-sagrado-direito-de-consumir-o-planeta/?autor=599

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