Por Reinaldo Canto*
A farra das sacolas
plásticas está de volta por decisão da Justiça
Para alegria
de muitos, a obrigatoriedade da entrega gratuita e indiscriminada das
famigeradas sacolinhas plásticas nas redes varejistas de São Paulo retorna por
determinação legal.
Nesse novo round, a Justiça invalidou o acordo
firmado entre o Governo Estadual e a Associação Paulista de Supermercados
(APAS), que previa a cobrança pelas sacolas no ato da compra. A Associação
prometeu recorrer, mas afirmou que irá cumprir a determinação.
A Justiça
levou em conta argumentos como o de direito adquirido anteriormente pelos
consumidores e os lucros financeiros com a venda das sacolas que já eram
embutidos nos preços dos produtos.
Quanto ao
segundo argumento nada a contestar, acredito realmente que seria justo debater essa questão e achar uma alternativa
não lesiva aos consumidores. As sacolas “gratuitas” eram realmente uma ilusão,
o consumidor sempre pagou por elas, mesmo sem saber disso.
Agora,
quanto a um direito adquirido, isso é no mínimo, algo difícil de aceitar! O
Código de Defesa do Consumidor brasileiro é um dos mais avançados do mundo e possui
em seus artigos um arcabouço legal de proteção aos direitos das pessoas, dos
consumidores contra a ganância, a irresponsabilidade e o poder econômico de
empresas e governos, na venda de produtos e na prestação de serviços. Por outro
lado, é preciso também entender que os consumidores, antes de tudo cidadãos,
possuem também responsabilidades.
As sacolas
plásticas são simbólicas nesse sentido. Se ao mesmo tempo os consumidores podiam
e novamente podem adquirir quantas delas achar necessário, eles também se sentem
no direito de descarta-las como e onde considerarem convenientes. Afinal, esse
consumidor não paga impostos?
A falsa
sensação da “sacolinha grátis” sempre fez com que esse artigo banal de consumo
não tivesse valor nenhum. Por essa razão, são inúmeros os exemplos de sacolas
“jogadas” em qualquer lugar. Muitas delas podem ser vistas cotidianamente e sem
nenhum esforço, basta olhar a sua volta, nos rios, mares, ruas e praças. Foram, por acaso, os marcianos que as
deixaram nesses locais? Não, foram os consumidores que possuem direitos
inalienáveis de fazer o que bem entenderem com elas.
Aos sempre
indignados com quaisquer mudanças que firam o ciclo insano do consumismo,
poderão afirmar não desprovidos de alguma razão, que tal proibição não resolve
nossos problemas de geração de lixo, de poluição e que existe uma infinidade de
produtos embalados em plástico pelos próprios fabricantes, etc, etc...
Tudo isso é
verdade! O que não altera a urgente necessidade de mudanças na maneira como
consumimos. A restrição no uso indiscriminado de sacolinhas plásticas tem um
caráter eminentemente simbólico e, bem ou mal, o consumidor já tentava se
adaptar a uma nova realidade com o uso de sacolas retornáveis. A Justiça freiou
esse processo, no meu entender de modo pouco inteligente.
Muitas
outras ações precisarão ser tomadas e implementadas com urgência, pois nossos
problemas ambientais só tendem a crescer de maneira exponencial nos próximos
anos. Se formos contar com a boa vontade das pessoas e a conscientização
voluntária, estamos condenados a acelerar cada vez mais a destruição dos nossos
recursos. É preciso dar passos rápidos no caminho para um mundo menos
insustentável.
A questão é não
ser possível acreditar que está tudo bem se a cada dia surgem novas informações
colocando mais e mais pressão sobre o planeta. O Programa das Nações Unidas
para o Meio Ambiente (PNUMA) calculou que a humanidade consumia em 2005, 60
bilhões de toneladas de recursos anualmente. Isso dá um consumo de 9 toneladas
para cada habitante do planeta. De lá
pra cá, não é preciso ser especialista, esses números só podem ter crescido.
Novamente
espero a manifestação daqueles revoltados que ficam aboletados em suas
poltronas prontos a criticar sem propor absolutamente nada: - Quer dizer que
você acredita que acabar com as sacolas plásticas vão resolver todos os nossos
problemas!
Se tivermos
sempre a atitude de contestar qualquer medida de limitação aos nossos
insustentáveis hábitos de consumo e tudo for visto como algo que: irá ferir
direitos e confortos pétreos e imutáveis, isso irá significar que num futuro
pouco distante, vamos conviver com restrições ainda mais severas. Elas,
invariavelmente, deverão ser tomadas de cima para baixo, impostas arbitrariamente
e penalizando, como sempre, primeiro os mais pobres.
Pense nisso
e enxergue um pouco além das sacolas plásticas. O problema é muito maior que o
plástico, mas também passa por ele!
*Reinaldo Canto é jornalista, consultor e
palestrante. Foi diretor de Comunicação do Greenpeace e coordenador de
Comunicação do Instituto Akatu. É colunista da revista Carta Capital,
colaborador da Envolverde e professor de Gestão Ambiental na FAPPES.
Artigo publicado originalmente na coluna do autor no site da revista Carta Capital: http://www.cartacapital.com.br/sociedade/o-sagrado-direito-de-consumir-o-planeta/?autor=599
Blog: cantodasustentabilidade.blogspot.com
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