Artigo publicado originalmente no site da revista Carta Capital
Ricardo Young*
Apesar de o quadro ser desanimador, os cidadãos ainda fazem valer seus direitos. E o Projeto Ficha Limpa, de iniciativa da sociedade, mostra que o povo não esmoreceu
Participei nos últimos dias de eventos políticos com representantes de diversos partidos e pude observar, em várias conversas, que existe uma frustração generalizada com o processo eleitoral e os jogos nem sempre limpos praticados nas várias esferas de poder, com destaque negativo para o poder legislativo.
Vivemos, portanto, um momento muito delicado no processo de consolidação da nossa jovem democracia. Um verdadeiro paradoxo ao qual precisamos ficar muito atentos, pois ele possui uma série de riscos bastante preocupantes.
Essa situação tem contribuído para que nos últimos anos tenhamos assistido a uma piora na qualidade dos políticos e o aumento na revelação de escândalos que a todos nós brasileiros, envergonha e revolta. Ao mesmo tempo esses desvios de conduta tem obrigado a criação de legislações cada vez mais rigorosas visando coibir todos esses tristes e nefastos casos de corrupção. De forma alguma defendo o afrouxamento das legislação eleitoral, mas ao invés de conseguir o efeito desejado, ou seja, a redução da corrupção, o que está acontecendo na prática, é que aquelas pessoas que exercem a boa liderança, que possuem um papel importante e cumprem da melhor maneira possível a sua missão, acabam sendo vítimas de um processo que vai desqualificando a classe política junto à sociedade de maneira progressiva.
É exatamente esse paradoxo onde temos um maior controle, uma rigidez cada vez maior sobre a atividade eleitoral coloca, por outro lado, os bons políticos como reféns de toda uma legislação que se torna mais restritiva e de difícil cumprimento a cada dia. Infelizmente, tal legislação cujo objetivo legítimo é o de combater a corrupção acaba por, assim dizer, desaminando os bons políticos a seguirem na vida pública, pois a todo momento se confundem com os maus políticos.
Esse paradoxo pode resultar em cenários distintos: para que ele se resolva de maneira positiva, nós não poderemos deixar sequer um dia passar, após essas eleições, sem reivindicar a reforma política em profundidade. A reforma política é a única maneira capaz de resolver esse impasse. A reforma política vai permitir o financiamento público de campanha reduzindo a desigualdade entre os candidatos e a força do poder econômico. A introdução do voto em lista e do voto distrital misto também vão contribuir para reduzir a personificação de candidatos dando lugar a partidos mais fortes e vigorosos. Essas mudanças fundamentais vão substituir o vale-tudo atual por uma maior transparência em todos os aspectos que se referem ao processo eleitoral no País.
Já, o contrário do que está colocado acima, ou seja, a não solução ou a resolução negativa desse paradoxo vai fazer com que aqueles que burlam a lei, terão espaço para continuar a agir do mesmo modo e, por consequência, aqueles que se sentem mais oprimidos por uma lei cada vez mais persecutória, simplesmente abandonarão a política e a vida pública. Esse seria o caso em que estaríamos sob o pior dos mundos, ou seja, vamos ter uma situação em que os legisladores vão continuar a legislar em prol dos seus interesses privativistas, patrimonialistas favorecendo grupos poderosos que, em geral, não atendem aos interesses maiores da sociedade brasileira. Para agravar ainda mais esse quadro teremos as boas lideranças da sociedade alijadas da política. Essa é uma situação que não podemos deixar que aconteça. Portanto, a mãe de todas as reformas é a reforma política.
Ficha Limpa exemplo a ser seguido - E para que mantenhamos a esperança por dias melhores, confiando no poder de uma sociedade comprometida temos o bom exemplo de todo esse processo de aprovação do Ficha Limpa. A legítima pressão da sociedade foi responsável por vencer as resistências de um parlamento sem interesse efetivo em vota-lo, isso mesmo contando com o apoio de mais de 2 milhões de assinaturas. Uma sociedade que não esmoreceu, que não capitulou diante de todas as ameaças, do caciquismo político tradicional. Essa é a demonstração clara de que apesar de termos um quadro desanimador a nossa frente, é evidente que o eleitor, que o cidadão tem força, se procurar fazer valer os seus direitos.
Eu quero estar a serviço desse eleitor. Desse eleitor organizado que vê a política como uma coisa necessária para o aperfeiçoamento das nossas instituições e que reconhece que essa luta política é construída de vitórias e derrotas. Mas acima de tudo uma luta que tenha como objetivo maior o interesse da maioria dos brasileiros.
*Ricardo Young é empresário, militante da causa da sustentabilidade e pré-candidato a senador por São Paulo pelo Partido Verde.
25 maio 2010
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